THEREUS é uma empresa de origem brasileira, de César Bentim e Cíntia Pereira, que iniciou a sua incubação no Tec Labs em 2019. Dedica-se à informação digital, rigorosa e verificada, sobre doenças limitantes ou incapacitantes. O ano de 2020 tem sido chave para a sua atividade, com o lançamento, em fevereiro, tanto do seu website como de uma página de Facebook dedicada à doença de Alzheimer. Transcrevemos aqui parte da conversa que tivemos com a Cíntia e o César.
Comecemos pela pergunta inevitável: como é que a situação pandémica afetou a empresa e a sua atividade?
O nosso trabalho já estava num momento 100% digital. O que nós sofremos, na verdade, foi uma questão de audiência. A atenção dos internautas migrou, muito fortemente, para os assuntos em torno do COVID-19.
Portanto, tiveram uma quebra na audiência?
Não diríamos que tivemos uma quebra, diria que tivemos uma concorrência maior por parte de outros assuntos que não o Alzheimer, e aqui, marcadamente, o Covid-19. Porém, as estatísticas disponíveis sobre o tráfego da nossa página de Facebook e do nosso website mostram que mantivemos uma tendência ascendente, um crescimento saudável. Ao nível da captura de audiência, percebemos que 24% dos visitantes da página regressam.
Claro que, durante este período, o segundo post mais visto (o primeiro foi uma entrevista com uma neurologista) foi um post em torno do Coronavírus e do Alzheimer.
É um ponto importante, e muito debatido, esse de termos vivido uma espécie de «monocultura» em torno do Covid-19, ficando outras doenças na sombra, por exemplo a doença de Alzheimer.
Sim. Há uma correlação directa entre envelhecimento e demência, e o Alzheimer é a principal forma de demência. Logo, importa perguntar – mas não nos cabe a nós responder – quantas pessoas que morreram de Covid-19 tinham Alzheimer? É uma pergunta que nos interessa directamente, que vale, claro, para outras doenças e causas de morte, como o ataque cardíaco, o AVC, etc.
Parece-vos que, após este período difícil, a população vai passar a ter maior atenção e preocupação com os mais velhos e com os problemas que os afectam, nomeadamente a doença de Alzheimer?
Os avanços da literacia em saúde são muito lentos, de um modo geral. E os inquéritos à literacia em saúde mostram níveis bastante baixos, embora os avanços existam. O desenvolvimento dessa literacia tem tudo a ver com programas de saúde pública e também com a iniciativa privada. Mas momentos de trauma como este ensinam bastante pela dor e não pelo desenvolvimento técnico e científico. Mesmo que a escala em Portugal seja menor que a de Espanha ou Itália, ou os Estados Unidos, acreditamos que vá sobrar uma preocupação maior depois de tudo passar.
Mudando um pouco a agulha: para que os leitores fiquem mais a par da vossa atividade, resumam-nos o que têm feito neste ano de 2020.
Este tem sido um ano-chave para nós. Terminámos o nosso pacote de soluções digitais. É desde logo muito importante falar da parceria com a Delta Soluções [incubada no Tec Labs], que concebeu o nosso website. Merecem elogios pela proximidade que tiveram connosco e pelo entendimento que tiveram com a nossa proposta.
Criámos também a nossa página de Facebook, e para isso fizemos um estudo de todas as redes sociais para percebermos qual seria a mais adequada, qual teria maior penetração. Concluímos que, em Portugal, ainda é o Facebook aquela que tem uma melhor performance – no Brasil, seria certamente o Instagram a plataforma escolhida.
Lançámos simultaneamente o website e a página de Facebook no dia 2 de fevereiro, e desde então temos estado focados na construção de um relacionamento com o leitor. No nosso MVP, temos previsto um período de 3 a 6 meses necessário para que essa relação se construa. O leitor precisa de se acostumar à nossa presença, através de uma similaridade de design, de comunicação, de conteúdos.
Depois desse período de 3 a 6 meses, vamos entrar numa nova fase, um momento crítico do nosso MVP. Vamos passar a pedir que os leitores respondam a questionários a partir dos quais vamos aferir o quanto o público adere às nossas propostas.
Para terem uma ideia: uma das estratégias que pensámos para este período passa pelo lançamento de brochuras, que têm informações muito práticas para o dia-a-dia do Alzheimer. Lançámos um teste, que traz um «atrativo», que pede para que as pessoas se registem na página de modo a receberem o documento mais rapidamente. Tivemos 15 inscritos, pessoas que interagiram, mas esperávamos bastante mais, perto das 50, e cremos que esse baixo número teve a ver com a situação do Covid-19. Por isso, estamos a corrigir um pouco o nosso copy para o lançamento da segunda brochura.
Em suma, estamos nesse momento de construção de audiência, e esse número dos 24% de visitantes que retornam é muito positivo.
Falem-nos um pouco mais dos movimentos na vossa página e website. Notámos que a página de Facebook, que é muito recente, já atingiu os 1500 likes, o que é um número bastante respeitável.
Importa dizer que essa audiência está focada 100% em Portugal. Temos muitos contactos no Brasil, mas evitámos publicitar a página junto desses contactos para não «poluirmos» as nossas estatísticas.
O nosso número mágico para a aplicação desses questionários são as 2000 pessoas, com entre 20 a 30% de visitantes regulares. Quando aí chegarmos, passamos à próxima fase.
Mas é preciso perceber que a nossa ambição não pára aqui. O português é a quinta língua mais falada do mundo, e queremos prestar este serviço aos falantes lusófonos. Mas o próximo passo, um scale up natural, é passarmos para o inglês e para o espanhol.
É importante não esquecer que a doença de Alzheimer é o MVP. Só depois de termos estatísticas, de termos provas de que este modelo de negócio funciona, é que temos verdadeiramente um produto. Aí podemos escalar, e estamos diante de um leque de oportunidades maravilhoso: poderemos aplicar este modelo a várias doenças, incluindo doenças raras.
Porque: qual é a dor que estamos a resolver? São duas. Por um lado, é a dor de quem, sendo doente ou cuidador de quem é doente, não tem acesso a informação confiável. Por outro lado, as indústrias farmacêuticas, as seguradoras, têm dificuldade em encontrar essas pessoas. Então, vamos poder fazer essa ponte entre um público que está carente de informação sobre a doença e um público que está carente de informação sobre os doentes. Em resumo, é isso que fazemos e queremos fazer.
Claro que por uma questão de compliance, há grandes barreiras no acesso das grandes empresas aos dados destas pessoas, e nós concordamos com a existência dessas barreiras, ainda bem que existem.
Podemos terminar com esse assunto sempre relevante: a privacidade dos dados.
Ora, esse é um dos nossos pilares. Nós estudámos o RGPD a fundo e creio que vamos além dele. Pelo nosso passado na indústria farmacêutica, sabemos do rigor, da burocracia saudável, que é necessário seguir para que as pessoas entrem em ensaios clínicos, por exemplo. Portanto, temos duas vertentes dentro desse pilar: uma compliance total com o RGPD e, por outro lado, o arcaboiço legal das pesquisas clínicas, que incorporamos no nosso próprio website. Ou seja: o consentimento informado para a recolha de dados está já incorporado no nosso próprio site. Apesar de não existirem regras claras para a extração destes dados, nós tratamo-los como se fossem estudos clínicos. Procuramos um rigor muito diferente do de outras plataformas.
Muito obrigado, Cíntia e César, por esta agradável conversa, e até breve!